O melhor concerto que posso ver num festival é, há já algum tempo, o do conforto: o meu e o das pessoas que inevitavelmente tenho comigo nesse tipo de eventos. Embora, no passado, tivesse ido a alguns festivais sozinho (porque muitas vezes a escolha era entre isso e não ir), a redução de mobilidade que, nos últimos anos, vi acentuar-se em mim, obriga-me ultimamente ter comigo pelo menos uma pessoa disposta a prestar cuidados. Quando a Access Lab me convidou a elaborar uma newsletter em que imaginasse o festival ideal, ocorreu-me que as sensações de conforto e de missão cumprida eram, no final de contas, os mais essenciais valores na hora de efectuar o balanço acerca do tempo passado em determinado evento. Qual é o melhor palco do festival? Aquele que proporcione condições o mais equitativas possíveis ao seu público. Qual é o festival com a melhor organização? Aquele que demonstrar um maior empenho ao atender às diferentes necessidades de quem o frequenta. Qual é o festival que mais se destaca em cada temporada? Aquele que mais fizer por desafiar os impossíveis em prol de uma experiência mais transversalmente digna. É verdade que eu muito gostaria, em apenas dois ou três dias de festival, ver o Nas, Modest Mouse, Bikini Kill, Freddie Gibbs, Jorge Ben, Kamaiyah, Yo La Tengo (porque nunca é demais) e Pega-Monstro ou Pinhead Society (caso se decidissem reunir). Mas, por mais que adore cada um desses nomes, a sorte de ver cada um desses concertos não seria de algum modo assombrada pelo azar de os ver sem as condições básicas de conforto? Bem sei que o tal conforto é um factor que pouco conta para o público jovem (também sobrevivi aos dilúvios bíblicos de Paredes de Coura sem me queixar), porém, a ordem de necessidades muda consideravelmente quando os quarenta anos começam a contar cada vez mais velinhas em seu redor no bolo. O Conan Osiris (que – já agora – também adoraria ver no “festival ideal”) disse-me em tempos que estar bem no plano da realidade era essencial para nos sentirmos igualmente confortáveis nas realidades alternativas que procuramos em videojogos. Ou seja, devemos assegurar o bem-estar da pessoa no sofá com um comando na mão antes que essa se projecte num avatar, que amealha pontos e atravessa níveis num mundo virtual. Essa é uma ideia desafiante, quando o que acontece normalmente é procurarmos nos jogos sensações que possam atenuar o mal-estar que nos afecta na realidade. Felizmente o Conan Osiris já se encontra a pensar por nós em 2039, um tempo em que a experiência do concerto provavelmente estará ainda mais próxima de proporcionar a virtualidade própria dos videojogos (isto quando vemos artistas contemporâneos como The Weeknd a explorar essa ideia de experiência imersiva nos seus espectáculos). O futuro é agora e permitam-me a vontade de querer para todos nós (e não apenas para pessoas com corpos perfeitamente funcionais) o conforto terrestre que em tudo melhora a viagem (tantas vezes extracorporal) proporcionada por cada concerto. O melhor concerto dos festivais do futuro deve ser o mesmo que os de hoje: um conforto igual para todos e todas. Miguel Arsénio Texto escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico. |
Miguel Arsénio é licenciado em Línguas e Literaturas – Português / Inglês pela FCSH e tem feito um pouco de tudo para dar uso ao sangue nas suas veias mais criativas: escreveu sobre música para o Bodyspace, Vice e uma ou outra revista de metal, faz stand-up comedy sentado enquanto Kadeirado e desenha constantemente o que lhe apetece. O ano passado lançou a zine de poesia “Mais hardcore, menos abacate” e para breve tem por editar uma BD na Erva Daninha.
Amplificador
Clipping
Redes sociais: um guia para não deixar ninguém de fora
Ler artigo – Jornal Público
As redes sociais são canais absolutamente obrigatórios para comunicar. Mas quantas pessoas ficam de fora porque quem comunica – enquanto indivíduo ou empresa – não conhece as tremendas ferramentas de acessibilidade que as redes sociais já têm? Um guia essencial
Agenda
Eventos com acessibilidade física, legendagem, Língua Gestual Portuguesa e Audiodescrição.
Cineteatro Louletano | Uma Outra Bela Adormecida
8 de julho, Loulé
Destaque: A história d’A Bela Adormecida foi contada pelo senhor Charles Perrault há muito tempo. Tanto que, mais de 350 anos depois, Agustina Bessa-Luís reescreveu o texto, dando-lhe novos significados a partir do mundo dos sonhos e do célebre sono da princesa adormecida. Neste espetáculo, Beatriz Brás, Martim Sousa Tavares e Francisco Lourenço revisitam esta história intemporal, contando-a também através de música e imagens.
”Uma outra Bela Adormecida” é uma reflexão sobre como, no palco do teatro ou enquanto dormimos, habitamos um mundo onírico onde experimentamos ser quem quisermos. E no fundo, crescer é nada mais nada menos do que isso mesmo.
+ info: Cineteatro Louletano
Acessibilidade: Audiodescrição na sessão das 17h.
Mais sugestões em www.cultura-acessivel.pt