Acessibilidade e inclusão são palavras que passamos a ouvir frequentemente nos últimos tempos e, se é certo que tal é essencial para tomarmos consciência do tanto que, no nosso País e no Mundo, temos ainda que evoluir nestas matérias, também propicia que nos apercebamos quão massificadas estão ideias erradas que, consciente ou inconscientemente, quase todos vamos tendo sobre o assunto.
Se é certo que, como nos diz Esopo: “Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar”, é urgente tomarmos consciência de que todos temos muito a aprender e a ensinar nesta área. Aprender e ensinar a ver, ouvir e respeitar verdadeiramente todos que, de algum modo, são ainda discriminados pela forma maioritária de pensar, viver e organizar a nossa sociedade, ou seja, de modo onde os padrões da maioria se propagam de tantas formas que excluem ou apenas vão dando “oportunidadezinhas” a todas as pessoas que não se enquadram nesses padrões dominantes.
Defendo há muito tempo que as escolas primárias deveriam capacitar-nos desde cedo a combater o preconceito e a consequente discriminação que surgem da facilidade com que a nossa mente classifica como “outro” quase tudo e todos que saem dos padrões da maioria de pessoas que nos rodeia física, social e intelectualmente. Essa capacitação ajudar-nos-ia a viver com menos necessidade de diferenciação entre o “nós” e “o outro”, habilitando-nos a receber a instrução de que, no fundo, todos carecemos para perceber como, de facto, é importante construir uma sociedade verdadeiramente inclusiva e acessível a todos (e são tantos os artigos disponíveis quenos demonstram as vantagens económicas, sociais e culturais da diversidade). Ajudar-nos-ia a não reproduzir padrões que, mesmo inconscientemente, vamos propagando menorizando e discriminando todos os “outros” que consideramos, de alguma forma, diferentes da maioria ou maiorias que, apenas por o serem, se tornaram “dominantes”.
E, fugindo ao incómodo óbvio de enfrentar os nossos preconceitos e receios, bem como todas as vezes em que os fomos propagando, vamos evitando a mudança que urge, aplacando a consciência ao confiar que muito ou tudo está já a ser feito, nomeadamente alguns mitos que se vão instalando, tais como: i) a legislação tem evoluído o que precisa para forçar a admissão de pessoas com incapacidade física (então e todas as outras?!) no mercado detrabalho, ii) o racismo é algo que não existe no nosso País de brandos costumes (não é frequente, a seguir a esta frase ouvirmos um inocente “eu até tenho amigos negros”?, iii) a discriminação social, sexual, religiosa e intelectual são apenas casos isolados que os media teimam em destacar.
Olhem que não… olhem que não. Assumamos de uma vez!
Precisamos de nos forçar a aprender de facto, a conhecer todos esses “outros” que catalogamos e que raramente ouvimos e vemos a falar por si mesmos em todos os lugares de onde falamos desde sempre. Mas, felizmente, é comum termos hoje muitos meios e recursos à disposição para conseguirmos finalmente compreender e respeitar o lugar e a visão de todos esses “outros” que, na verdade, não conhecemos verdadeiramente. Mas devíamos. Devemos!
Ainda bem que este é um assunto da ordem do dia. Que assim continue até que avancemos e nos possamos aproximar do adágio: “Todos diferentes, todos iguais!”.
Francisca Fernandes
Nascida no Porto, Francisca licenciou-se em Direito pela Universidade Católica Portuguesa e em Direção de Empresas da AESE – Escola de Direção de Negócios. Exerceu advocacia empresarial e foi dirigente de Teatro Nacional S. João durante 16 anos. Integrou a empresa municipal Ágora – Cultura e Desporto do Porto, E.M, S.A em 2018, sendo Diretora Geral de Cultura até julho de 2022. Desde então assumiu a Direção de Novos Projetos, destacando-se neles os futuros Centros Culturais Matadouro e CACE. É ainda Presidente da Direção da Performart – Associação para as Artes Performativas em Portugal e Membro do Conselho de Administração da União de Teatros da Europa.
Clipping
Marketeer | Acessibilidade da Altice Arena
Entrevista a Jorge Vinhas da Silva, CEO da Altice Arena.
A Altice Arena está mais acessível a pessoas com deficiência. Em conjunto com a Access Lab, a Altice Arena tem vindo a desenvolver, nos meses mais recentes, o projeto Acessibilidade, para tornar a cultura acessível a todos.
Amplificador
Descodificador
Qual a diferença entre Assistente Pessoal e Cuidador?
A figura de Assistente Pessoal é a de um profissional pago para dar assistência à pessoa com deficiência nas diferentes áreas da sua vida. Seja na higiene pessoal, vida social ou profissional.
Já um Cuidador pode ou não ser um familiar. É alguém que fornece cuidados íntimos e pessoais como a higiene ou alimentação. Pode ser utilizado este termo se a pessoa usar esta nomenclatura. No entanto, assumir que o acompanhante ou assistente pessoal de uma pessoa com deficiência é sempre o seu cuidador é desconfortável.
Agenda
Eventos com acessibilidade física, legendagem, Língua Gestual Portuguesa e Audiodescrição.
AMAS – Auditório Municipal António Silva | TIME
13 e 14 de maio, Lisboa, Cacém
Destaque: TIME, é uma peça de dança para adolescentes, criada para três atores, em torno do tema “tempo”, como resposta ao desafio de se trabalhar, a ideia de utopia e de mudança. Desde a antiguidade que a natureza do tempo se apresenta como uma das maiores questões filosóficas, quer pela tentativa de compreender a sua linearidade, passado, presente e futuro, quer pela sua subjetividade, uma vez que é interpretado por cada um de maneira diferente, sendo muitas vezes essa interpretação influenciada pela situação que se vive em determinado momento.
+ info: Bilheteira online
Acessibilidade: Interpretação em Língua Gestual Portuguesa.
Teatro Nacional São João | Hamlet
12 e 13 de maio, Porto
Destaque: Um grupo de pessoas com síndrome de Down sobe ao palco para partilhar os seus desejos e frustrações a partir de uma versão muito livre de Hamlet. O espetáculo resulta de um cruzamento entre o texto de Shakespeare e as vidas dos atores, animado pela pergunta existencial que popularizou o príncipe da Dinamarca: ser ou não ser? O que significa ser para pessoas que são consideradas um fardo, um refugo social? Que sentido e valor tem a sua existência num mundo em que a eficácia e modelos inatingíveis de consumo e beleza são o paradigma do humano? Hamlet é dirigido por Chela De Ferrari, um dos membros fundadores do Teatro La Plaza, coletivo peruano que parte de textos de autores clássicos e contemporâneos para levantar espetáculos capazes de “questionar, provocar e surpreender”.
+ info: Teatro Nacional São João
Acessibilidade: Espetáculo legendado.
Mais sugestões em www.cultura-acessivel.pt